sábado, dezembro 13, 2008

momento cultural I...

Blindness
















Comecei a ler o "Ensaio sobre a cegueira", de José Saramago, há uns anos atrás, não sei precisar, mas ainda vivia em casa dos meus pais. Li até 1/3 do livro, talvez. Não fui capaz de continuar e agora percebo porquê. Como podia eu ter capacidade de entender possíveis metáforas, se ainda hoje tenho dificuldades.

I. Como me lembraram recentemente, quando alguém escreve pode simplesmente não querer dizer nada, ou querer dizer algo simples, o que está somente escrito, nas palavras exactas.
Não acho que seja o caso. Não conheço Saramago, mas parece-me que ele escreve especificamente algo, algo que quer transmitir. Aqui, precisamente, uma crítica à sociedade, à "cegueira humana". Ele próprio o afirmou em reportagens recentes.
Ainda assim, ele escreveu um livro que foi interpretado para filme por alguém e que é interpretado por quem lê e quem vê de mil maneiras diferentes.
E acho que o Saramago não se importa, desde que ponha as pessoas a pensar. E o filme consegue-o e bem. Transtorna, mexe, revolta, inquieta, incomoda. Bom!


II. Saí de lá também intrigada, a tentar perceber tudo. Duas coisas que não consegui descortinar: porquê ela, porquê uma só pessoa que nunca deixa de ver? Talvez seja o tal factor aleatório da escrita, talvez não. Ela representa, para mim, a lucidez, mas não consigo entender o objectivo, se é que há 'um' ou 'o' objectivo?!
E porquê os santos de olhos vendados? Para este detalhe não sou capaz, de todo, de arranjar uma interpretação plausível.
E o giro, é que, desde que vi o filme, já fiz várias interpretações de várias coisas, a título pessoal, a título colectivo, mais e menos abrangentes, à vida de cada um e à sociedade em geral.


III. Das coisas que mais penso em relação ao filme é que quando nos deixamos "cegar", lentamente, à nossa volta, tudo vai ficando sujo, podre, pobre. E quando voltamos a ver, é um caminho difícil voltar a "colocar tudo no lugar", limpar, arrumar, (re)arranjar. Mas é sempre uma boa sensação, essa de voltar a ver e ter nas mãos a capacidade de modificar o que está à nossa volta, em prol do nosso bem estar e dos outros. É um dom, que se torna um dever.

IV. Marcou-me também o peso que acarreta a única pessoa que vê e o quão seria mais fácil desistir, acomodar-se, "deixar de ver também". Mas ela luta até ao fim e tem uma capacidade de encaixe, de aceitação, lucidez para agir ou não agir, para reagir ou esperar. Quem vê também sofre. Ela vê, mais do que com os olhos, com o coração e a mente.

Hei-de rever o filme, talvez ler o livro, mas continuo a "meditar" sobre a tal cegueira...


1 comentário:

micose_ou_mifrita disse...

deixaste-me cheio de vontade de ver o filme..

e atenção, é "apenas" uma interpretação mais ou menos subjectiva (ou então, pessoalmente objectiva, de um fã de um livro... metafórico)