domingo, setembro 28, 2008

artigos...


“Há uns tempos a Joana
- Pai, acabei um namoro à homem

Perguntei como era acabar um namoro à homem e vai a miúda
- Disse-lhe o problema não está em ti, está em mim
o que me fez pensar como as mulheres são corajosas e os homens cobardes. Em primeiro lugar só terminam uma relação quando têm outra. Em segundo lugar são incapazes de
- Já não gosto de ti
- Não quero mais
chegam com os discursos vagos, circulares
- Preciso de tempo para pensar
- Não é que não te amo, amo-te, mas tenho de ficar sozinho umas semanas
ou declarações do género de
- Tu mereces melhor do que eu
- Estive a reflectir e acho que não te faço feliz
- Necessito de um mês de solidão para sentir a tua falta
e aos amigos
- Dá-me os parabéns que lá me consegui separar da chata
- Custou mas foi
- Amandei-lhe aquelas lérias do costume e a gaja engoliu
- Chora um dia ou dois e depois passa-lhe
e pergunto-me se os homens gostam verdadeiramente das mulheres. Em geral querem uma empregada que lhes resolva o quotidiano e com quem durmam, uma companhia porque têm pavor da solidão, alguém que os ampare nas diarreias, nos colarinhos das camisas, nas gripes, tome conta dos filhos e não os aborreça. Não se apaixonam: entusiasmam-se e nem chegam a conhecer com quem estão. Ignoram o que ela sonha, instalam-se no sofá do dia a dia, incapazes de introduzir o inesperado na rotina, só são ternos quando querem fazer amor e acabado o amor arranjam um pretexto para se levantar (chichi, sede, fome, a janela de que se esqueceram de baixar o estore)
ou fingem que dormem porque não há paciência para abraços e festinhas, pá, e a respiração dela faz-me comichão nas costas, a mania de ficarem agarrados à gente, no rónhónhó, a mania das ternuras, dos beijos, quem é que atura aquilo? Lembro-me de um sujeito que explicava
- O maior prazer que me dá ter relações com a minha mulher é pensar que durante uma semana estou safo
e depois pegam-nos na mão no cinema, encostam-se, colam-se, contam histórias sem interesse nenhum que nunca mais terminam, querem variar de restaurante, querem namoro, diminutivos, palermices e nós ali a aturá-las. O Dinis Machado contava-me de um conhecedor que lhe aclarava as ideias
- As mulheres têm fios desligados
e um outro elucidou-me que eram como os telefones: avariam-se sem que se entenda a razão, emudecem, não funcionam e o remédio é bater com o aparelho na mesa para que comecem a trabalhar outra vez. Meu Deus, que pena me dão as mulheres. Se informam
- Já não gosto de ti
se informam
- Não quero mais
aí estão eles a alterarem a agressividade com a súplica, ora violentos ora infantis, a fazerem esperas, a chorarem nos SMS a levantarem a mãozinha e, no instante seguinte, a ameaçarem matar-se, a perseguirem, a insistirem, a fazerem figuras tristes, a escreverem cartas lamentosas e ameaçadoras, a entrarem pelo emprego dentro, a pegarem no braço, a sacudirem, a mandarem flores eles que nunca mandavam flores, a colocarem-se de plantão à porta dado que aquela puta há-de ter outro e vai pagá-las, dispostos a partes-gagas, cenas ridículas, gritos. A miséria da maior parte dos casais, elas a sonharem com o Zorro, Che Guevara ou eu, e eles a sonharem com o decote da vizinha de baixo, de maneira que ao irem para a cama são quatro: os dois que lá se deitam e os outros dois com quem sonham. Sinceramente as minhas filhas preocupam-me: receio que lhes caia na sorte um caramelo que passe à frente delas nas portas, nãos lhes abra o carro, desapareça logo a seguir por chichi-sede-fome-persiana-mal-descida-e-os-ladrões-percebes, não se levante quando entram, comece a comer primeiro e um belo dia
(para citar noventa por cento dos escritores portugueses)
- O problema não está em ti, está em mim
a mexerem na faca à mesa ou a atormentarem a argola do guardanapo, cobardes como sempre. Não tenho nada contra os homens: até gosto de alguns. Dos meus amigos. De Schubert. De Ovídio. De Horácio, de Virgílio. De Velásquez. De Rui Costa. De Einzenberger. Razoável a minha colecção. Não tenho nada contra os homens a não ser no que se refere às mulheres. E não me excluo: fui cobarde, idiota, desonesto.
Fui
(espero que não muitas vezes)
rasca. Volta e meia surge-me na cabeça uma frase de Conrad em que ele comenta que tudo o que a vida nos pode dar é um certo conhecimento dela que chega tarde demais. Resta-me esperar que não seja tarde para mim. A partir de certa altura deixa de se jogar às cartas connosco mesmos e de fazer batota com os outros. O problema não está em ti, está em mim, que extraordinária treta. Como os elogios que vêm logo depois: és inteligente, és sensível, és boa, és generosa, oxalá encontres etc., que mulher não ouviu bugigangas destas?
Uma amiga contou-me que o marido iniciou o discurso habitual
- Mereces melhor do que eu
levou como resposta
- Pois mereço. Rua.
Enfim, mais ou menos isto, e estou a ver a cara dele à banda. Nem uma lágrima para amostra. Rua. A mesma lágrima para amostra. Rua. A mesma amiga para uma amiga sua.
- O que faço às cartas de amor que me escreveu?
e a amiga sua
- Manda-lhas. Pode ser que lhe façam falta.
Fazem de certeza: é só copiar mudando o nome. Perguntei à minha amiga
- E depois de ele se ir embora?
- Depois chorei um bocado e passou-me.
Ontem jantámos juntos. Fumámos um cigarro no automóvel dela, fui para casa e comecei a escrever isto. Palavra de honra que na janela uma árvore a sorrir-me. Podem não acreditar mas uma árvore a sorrir-me.”

António Lobo Antunes In Visão


sábado, setembro 27, 2008

(re)ânimo...



















O telefonema. Não me aliviou a alma, não descobri nada de novo, mas partilhei e ouvi. Tem sempre palavras sábias, sinceras. Sabe bem o que diz porque já pensou muito (e bem)... Cautelosa, atenta, amiga. Tem noção do que é a vida e de como as pessoas comuns a vivem. Não tenho medo de falar o que sinto, o que penso, ou até o que não penso, mas sinto só no imediato. Deixou-me inquieta. O telefonema. Porque o futuro não passou, mas vai acontecer. E não é o fim, é o princípio. E ela sabe. E eu percebi. Faz crescer por dentro.

E não sei ao certo nada dela. Nem sei como posso fazê-la mais feliz, mimá-la também. Queria poder ser também mais próxima, dar mais e receber menos. Recebo sempre. Construo pouco.

Fim do telefonema. O bloco. "Vem aí um senhor para suturar. Bora?" Sim. Houve uma altura em que
ela também não sabia. Sabia pouco. Sei pouco. Mas ela agora sabe bem aquilo que faz. Faz com cuidado. Profissionalismo. Bom senso. Respeito. Boa! Agora já sabes. E sei mais um pouco. E sou capaz de aprender também.


Fim de bloco. A sala. "Vocês têm aqui uma mulher do norte? No interior do país, a norte, não há consciência moral!" Ela não sabe que eu sou do interior do país, a norte. Não sabe que é na cidade que não há consciência moral. Silêncio. Escuto. Ela não sabe porque ela nunca viveu o outro lado do país. Passou que nem viajante. Não censuro.


Ela, ela e ela...

quinta-feira, setembro 25, 2008

desenraizar...


Afinal até gosto...


Vou aprendendo comigo, com os outros e com o tempo. Há coisas a manter! Quero poder lutar sempre por aquilo em que acredito, até ao dia em que não tiver mais forças ou perceber que a luta já não depende de mim. Quero ser crescida, não me importo de já não ser pequena. Posso folgar às vezes, parar para respirar e ganhar energias, mas sou rápida, gosto de ser rápida, de reagir e de me superar. Há dias em que é difícil acreditar, mas a mente continua a ser pilar das acções e do coração.
Acima de tudo gosto de lutar por pessoas, quer no trabalho quer no dia-a-dia. Gosto de gostar das pessoas também pelo que diferem de mim. Custa. Nem sempre consigo. Perco a paciência e a atenção, desligo. Mas também gosto de conquistar, de ser reconhecida, de saber chegar. Tem sido cada vez mais difícil surpreender!
O entusiasmo é ocasional. A emoção esporádica. E talvez por isso tenham tanto valor. As certezas e convicções, essas sim, alegram, por caminhos tortos, às vezes.

E afinal engano-me tantas vezes, assumo noções distorcidas, dou como certo o errado, e como errado o talvez... sem antes viver, experimentar, não me deve ser permitido afirmar convictamente o que gosto e é melhor para mim.

Porque afinal têm sido uma surpresa, estes dias a observar, a aprender, a entusiasmar-me. Não sei até quando, mas mais uma lição já não deixo fugir.

E, na fidelidade que procuro para mim, há lugar para o incerto...

"ralações"...

























Os pais sabem sempre muito.
O meu "pai", embora não se caracterize por uma idade avançada, tem já alguma experiência de vida que eu não tenho e algumas reflexões a mais do que eu. Há dias falava com o meu pai, em passeio pela calçada, e ele dizia-me que há coisas que aos 18, 22, 24 anos não podemos perceber, ainda não vivemos o suficiente. Fiquei a pensar nisso. É lógico isto, até óbvio, mas mexe com o meu sistema nervoso a influência da maturidade das pessoas em tudo o que implica o ser humano. Tenho eu que esperar pelos 28 ou 30 para perceber determinadas coisas, relativizar outras, deixar os sonhos de menina descer à terra e aguardar ainda que a maior parte do meu círculo de amigos, que tem uma idade próxima à minha, atinja também o tal estado adulto!? Pois se a vida é em directo e as oportunidades nos fogem por entre dedos, onde está a essência de tudo isto?

No mesmo dia em que passeei com o meu pai, encontrei inesperadamente uma daquelas pessoas que entrou na minha vida há uns anos e não sairá a não ser com a força de alguma doença, daquelas que afectam a memória. A meio de uma conversa casual apercebo-me que estou num processo de autonomia desde 1999. Isto poderia não ter qualquer interesse, se 9 anos não me definissem, e no meio de tantas qualidades que procurei desenvolver, a incapacidade de perceber que o outro pode ser diferente de mim e igualmente válido não surgisse também, nas alturas em que menos convém... Ser autónoma, quase independente, num processo gradual tem o seu quê!?


Ando ralada com as pessoas e sem paciência para elas. Ralo-me ao longe. Já sabia que funcionava mais ou menos por ciclos, motivações e necessidades. Sinto-me a voltar a um tempo até recente, com os mesmos desafios interiores, e semelhantes desafios externos, acrescidos somente pela dificuldade inerente aos conhecimentos adquiridos. É suposto caminharmos em frente, aprendermos com os erros, mas sinto-me a sentir o mesmo, a fugir do mesmo, a lutar pelo mesmo, a reagir da mesma maneira, que há um tempo atrás... Não terei eu dado um passo em falso em algum momento da minha vida que precise de ajustar!?


Tenho o vírus nómada reactivado em mim... mas desta vou contrariá-lo e tentar não me ralar tanto!?

terça-feira, setembro 16, 2008

chegadas...


Um auditório com muitas pessoas. Antes disso um átrio com muitos "brancos", todos "arranjadinhos", bronzeados, regressados de uma praia ou viagem qualquer. Um 'susto' mal abafado pelas palavras. Depois um senhor sabido, palavras vãs, alguns senhores a falar de si, do que não fazem e dizem acreditar. Ao outro dia uma enfermaria, muitos doentes, muitas batas brancas, muita gente já atarefada. Um balanço geral, pouco balanceado, uma tentativa de perceber o caminho certo, numa odisseia em que ninguém me perguntou se queria participar.
E tudo está escuro... lá fora e cá dentro. Assim pequeno, perdido, sigo a única linha que consigo ver.

segunda-feira, setembro 15, 2008

"ilógicas"...




Tenho vindo a pensar e a falar sobre pessoas e relações.

Há dias dei por mim a pensar que as pessoas, assim como tudo na natureza, têm papeis específicos, que não devem ser ocupados por outros.
A mãe é mãe. Por mais amiga que possa ser, tem que cumprir o seu papel de mãe, ser por vezes conselheira, por vezes alarmista, autoritária, irritante, galinha, atenta e perspicaz. Ninguém pode substituir este papel de mãe, nem as avós, ditas "mães duas vezes".

O pai é normalmente a figura mais "temida na casa". "Pede ao teu pai!; Já falaste com o teu pai?" O pai, às vezes, é mais sensato que a mãe, consegue pôr de lado o instinto maternal, que não tem, e ver com mais clareza. O pai conforta, chama à atenção, fala só com o olhar. Ninguém pode ser pai, a não ser o próprio.
O irmão/irmã depende já em si do número de filhos, da relação que os pais incutem, da diferença de idades, de sexo. Mas o irmão é o amigo das ocasiões várias, sabe alguns segredos, é protector e conselheiro. Quanto mais adulto, mais aprende e domina a sua "posição", aprende a ser paciente e a gostar mais ainda. O irmão é muito importante, porque, e de acordo com as leis naturais, quando os pais se vão, é o irmão o "pilar e a casa".
Os avós são aqueles que nos olham de cima, não percebem tudo e nem têm que perceber. Devem ser acarinhados e reconhecidos, porque, em última instância, são a base da pirâmide. Dão todos os mimos que, por "lei", não são permitidos aos pais, no decurso da boa educação dos filhos.
Os tios e primos, os próximos afectivamente, são a alegria da família, os laços descontraídos, os "pontos de abrigo". Dão número e cor, ajudam ao equilíbrio.

Os amigos, "amigos há muitos". Há os bons e os menos bons, os mais loucos e mais "certos", os mais próximos e os de momento. Os amigos nem sei... são as relações mais inconstantes. Variam com a idade, com as circunstâncias da vida, com as mudanças de cada um, com outros amigos. É difícil preservar amigos, não os conhecidos, mas os amigos. Preservar os contactos, os afectos, os pontos comuns.

Os melhores amigos também variam, com outra série de factores. Passada a adolescência não pode haver "o melhor amigo", a vida não o permite, revelaria imaturidade nas relações. Têm o papel fundamental de ouvir e ouvir, as maiores barbaridades e confidências.

O namorado/namorada é tudo o que todos estes não são e mais um pouco de cada um. Não são mãe nem pai, embora às vezes pareçam, não são só amigos, embora seja parte essencial da relação; não são os melhores amigos, caso contrário não se poderia falar do namorado/namorada aos melhores amigos.
Os conhecidos, vão e vêm... ás vezes iludimo-nos com um desconhecido, na expectativa de que possa ser um novo amigo, outras vezes surpreendemo-nos com quem à primeira vista não passava de um mero desconhecido desinteressante.


No fundo, falar de pessoas e relações não é mais do que um desperdício de tempo, meio ridículo até, pela ambiguidade e incoerência que implica, para além da falta de razão. Mas é de pessoas e de relações que vivemos, em constante mutação. Porque tudo isto faz sentido hoje para mim, nenhum sentido para ti, amanhã deixa de ser a minha realidade, passa a ser a dele... e as pessoas vão ser sempre pessoas e relacionar-se entre si, com o objectivo último e comum de se sentirem acolhidas, queridas e amadas.

terça-feira, setembro 09, 2008

3º espaço...

Eu... voltei...



Mas parte de mim...